Quando pensamos em biológico pensamos em vegetais escanzelados, fora do formato, pequeninos vendidos por agricultores de cara enrugada e escurecida pelo sol.
Há uns anos atrás conheci um produtor de vegetais que já fornecia para as grandes superfícies. Ao apresentar-me a sua exploração onde estavam várias estufas, métodos de recolha e acondicionamento de dimensão industrial, justificava a sua escolha como: – “Temos de nos manter atualizados senão somos deixados para trás.”.
É graças a estes agricultores que hoje é possível que o biológico esteja acessível em locais onde não era sequer sonhado há dez anos atrás.
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Segunda feira, cerca das 16h, loja Miosótis – secção das saladas. Os pacotes arrumadinhos e de plástico colorido e luzidio, embora ainda no prazo de validade, continham vegetais maioritariamente amarelados e cansados de um fim de semana intenso. Virei vários sacos, agitei alguns, procurei no final da fila de embalagens – nada.
Ao lado destes descobri vários pacotes de rúcula. Transparentes com um tamanho maior que o normal e com um rótulo artesanal impresso a preto e branco. No interior a rúcula amontoáva-se, caótica, com tamanhos e formatos que nunca tinha visto antes. Mas de aspeto verde e vital.
No rótulo dizia Rúcula cultivada biológica do produtor João Torres Costa. Pouco mais que isto.
Hoje Domingo, quase uma semana depois, a rúcula matém-se viva e tem fornecido às minhas saladas e sopas o que eu estava á procura – um toque selvagem que só os produtos que têm identidade própria possuem.
Uma das diferenças dos alimentos biológicos é a sua duração em relação aos alimentos químicos. As alfaces duram mais de uma semana – viçosas. As cenouras mantêm-se doces durante um tempo impensável em relação às suas congéneres não bio.
No entanto, existe hoje já uma área cinzenta de artigos biológicos desenhados para se “manterem atualizados em relação ao progresso”. Estes produtos estão calibrados, são apresentados em embalagens apelativas, estão pré-lavados e standardizados. São bio mas mantém-se vivos por um tempo consideravelmente menor e muitas vezes semelhante aos outros vegetais que foram colhidos numa exploração química. Por exemplo um saco das outras rúculas, apesar de ser bio e ter ganho já alguns prémios, dura-me depois de aberto e mesmo no frio no máximo 3 dias.
Sinto-me por isso compelido a criar um galardão para os vegetais feios como os do João Torres Costa e para todos os outros produtores que pela sua presença – “fora da caixa” sem medo de serem “deixados para trás” – transmitem o manifesto de que a vida pode ser afinal como os produtos que cultivam: orgânica, selvagem, única, imprevisível e sem data de expiração determinada.
Tudo depende do que escolhe trazer para casa no seu saco das compras.
Boas práticas.
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